Marcelo Lira – PCB: “Queremos transferir poder ao cidadão”

O professor de Antropologia do Instituto Federal de Goiás, Marcelo Lira, é candidato ao governo estadual pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Postado em: 14-08-2018 às 06h00
Por: Sheyla Sousa
Imagem Ilustrando a Notícia: Marcelo Lira – PCB: “Queremos transferir poder ao cidadão”
O professor de Antropologia do Instituto Federal de Goiás, Marcelo Lira, é candidato ao governo estadual pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB)

Por que o PCB não fez alianças para esta eleição? 

O PCB é um partido programático e não é um partido de aluguel. Os partidos que aí estão não representam as demandas reais da população. Nosso partido tem um programa e as alianças são feitas a partir desse programa. O PCB vem de uma construção com os movimentos sociais desde 2015, quando já se anunciava o golpe de estado de 2016. Nesse sentido construímos uma frente ampla com várias entidades progressistas da sociedade para garantir esses direitos dos trabalhadores. Ao mesmo tempo construímos uma frente de esquerda com movimentos sociais e partidos que de alguma maneira caminham para defender o socialismo e entre eles está o Psol. Infelizmente aqui em Goiás a aliança não foi possível. 

Continua após a publicidade

Qual a estrutura o PCB tem hoje para conversar com o eleitor goiano? Com o tempo curto de programa eleitoral na TV.

Não formamos alianças pensando em tempo de TV e propaganda eleitoral. Fizemos aliança em torno do nosso programa, quem se identifica com o nosso programa, caminha conosco. É isso que constrói a alternativa do PCB.  Nós estamos organizados em Goiás desde 2000 e ao longo desse processo apresentamos candidatos nas últimas eleições, como a candidatura da professora Marta Jane. Temos organização na região Metropolitana de Goiânia e em outras cidades. Infelizmente a legislação eleitoral privilegia os partidos que estão no poder não nos dando acesso a tempo de televisão. Portanto boa parte da nossa campanha vai ser pelas redes sociais e pelo corpo a corpo com o eleitor. 

Não foi dialogado com o PCdoB ou o PT uma possível aliança?

Não consideramos hoje o PT como uma alternativa de esquerda. Não cogitamos uma aliança com o PT e o PCdoB. Tentamos construir essa aliança com o Psol, mas esbarramos em questões programáticas. 

Como avalia agora, nesse cenário, os movimentos sociais defendendo a ditadura, já que o PCB tem uma história grande na luta contra o regime militar?

Esse cenário é típico de um golpe de Estado. Um Estado de exceção. Esse golpe de estado fragilizou ainda mais as instituições políticas, que não eram sólidas, e elas começaram a flertar com o fascismo e com esses setores mais conservadores. Por fim, acabaram abrindo essa caixa de pandora que se chama Jair Bolsonaro. Esse cenário só é possível dentro da irresponsabilidade dos partidos que apoiaram o golpe. E também por não termos feito o acerto de contas direito com a ditadura militar. 

O que mudaria na proposta do partido sobre a organização do Estado? Pensando no ponto de vista do comunismo, que é a proposta do partido.

Todo Estado tem por suas próprias características centralizar e concentrar poder. O Estado que nós vivemos não é diferente. Por isso as decisões tomadas no âmbito político são totalmente apartadas do desejo da sociedade. O que o PCB apresenta como proposta é descentralizar esse poder. Vamos trabalhar com o princípio do poder popular. Isso seria retirar poder do Estado e levar à sociedade organizada. Então o debate e a condução das políticas públicas passariam a fazer parte da população. Isso serviria para todas as áreas. Nós temos um ruralista no Ministério do Meio Ambiente e um banqueiro no Ministério da Fazenda. Não dá para trabalhar com essa lógica porque beneficia o mercado. Uma dúzia de bilionários decidem a política econômica do País. Nós defendemos o poder da população a partir desses órgãos de democracia direta. 

Como lutar para melhorar a segurança do Estado com esse modelo de administração?

A segurança é bastante complexa e estrutural. Não se enfrenta ela como vem sendo conduzida pelos governos. Temos um problema grave que é a dualidade de polícias: militar e a civil. A militar que é ostensiva e a civil que é a judiciária. Em via de regra, todas os Estados dão prioridade a essa polícia militar e descartam a civil. Por isso temos esses números de 61 mil homicídios no País e apenas 20% deles são investigados. A estrutura de Polícia Civil está desbarata. O PCB defende a desmilitarização das polícias criando só uma polícia civil. Isso garante esses direitos do trabalhador. Temos a polícia que mais mata, mas também a que mais morre. 

A desmilitarização não perderia forças para combater os criminosos que estão muito bem articulados?

Não. Ao longo desses anos, condenaram os Direitos Humanos, que são os direitos fundamentais do cidadão e acabou deseducando a população. A população acabou acreditando que os direitos humanos privilegiam os criminosos. Isso é equivocado. Não significa uma perda de força. A maioria dos soldados da Polícia Militar apoia a desmilitarização. Quem não apoia é a alta cúpula da PM porque envolve interesses políticos e econômicos que essa cúpula tem. Por isso assistimos a militarização das escolas em Goiás. 

Mas, as escolas militares são bem avaliadas pela população pela qualidade do ensino. Qual seria então a proposta do PCB para o modelo de ensino? 

Obviamente o trabalhador vai defender que seu filho tenha a integridade física em diversos espaços, principalmente na escola. As escolas hoje são um problema porque a nova república não trataram o ensino da forma como deveria ter sido feito. Pelo contrário, o ensino foi mais desmantelado. Os professores tem uma jornada de trabalho exaustiva e as escolas não tem estrutura nenhuma. Por isso apoiam a militarização. O regimento da escolas militares é igual ao da Polícia Militar. O estudante não tem liberdade de expressão como a polícia também não tem. Por isso defendemos o modelo integrado de ensino, que articula a ciência, cultura e trabalho, e a partir da daí oferece as formações mais variadas aos alunos. 

Como avalia o modelo de terceirização nos hospitais públicos e qual proposta para a saúde do Estado?

No Brasil temos um sistema de saúde que é elogiado no mundo inteiro. O Sistema Único de Saúde foi elaborado nos anos 80. Mas o modelo deveria ter sido implementado por inteiro e não foi, acabou sendo implementado pontualmente. Os governos optaram por desarticular o SUS, que deveria oferecer saúde integral e gratuita ao cidadão, e a partir da desarticulação optaram por contratar as Organizações Sociais privadas. Por isso vemos esses convênios fazendo o que querem. Por isso defendemos o sistema público de saúde fortalecido.

Sem OSs?

Sem OSs, que é uma forma indireta de privatização da saúde. é transferir o recurso público para uma empresa privada administrar. As empresas privadas querem lucro. Nenhuma empresa vai trabalhar por filantropia. E para ter lucro, eles acabam deteriorando os serviços de saúde. 

A reforma que o senhor defende é ampla, que demanda tempo e energia. Qual proposta pontual para a saúde básica?

É preciso melhorar a estrutura existente e tentar expandi-la. Claro que isso passa pela saúde pública. Nós assistimos um processo de tentativa de colocar o servidor público como um privilegiado e ele não é. O serviço públicono Brasil hoje é uma forma de distribuição de renda indireta. 

Como o PCB vê hoje a situação financeira do Estado? Muitos especialistas dizem que não existe um bom equilíbrio fiscal. Como ajustar isso?

O Estado tem uma base de desenvolvimento fundamentada no agronegócio. O PCB defende um desenvolvimento fundamentado na agroecologia. Essa proposta enfrenta diretamente o latifúndio e o poder econômico. Esse modelo que defendemos é uma forma de democratizar o acesso à terra e outro tipo de economia. A crise fiscal passa diretamente pela dívida pública. E essa dívida hoje consome mais de 50% do PIB brasileiro. Se não fizermos uma auditoria profunda na dívida pública e não mexermos no orçamento, não vamos conseguir equilibrar as contas do Estado.  

Veja Também